Escutamos no evangelho de hoje: O Anjo do Senhor aproximou-se dos pastores e a glória do Senhor cercou-os de luz; e eles tiveram grande medo. Disse-lhes o anjo: Não temais, porque vos anuncio uma grande alegria para todo o povo: nasceu-vos hoje, na cidade de David, um Salvador, que é Cristo Senhor.
Nesta noite, cerca-nos a luz, inunda-nos a luz Natal para anunciar que Jesus é a nossa alegria, o Menino de Belém é Jesus Cristo, o Salvador. É Ele aquele a quem as profecias chamaram o Emanuel, Deus connosco.
Sim, Deus connosco, naquela noite em Belém; Deus connosco na última ceia e em cada Eucaristia; Deus connosco na Igreja e em cada ser humano, especialmente nos mais frágeis como Ele, criança em Belém ou crucificado no calvário; Deus connosco também hoje e sempre, em cada lugar e em cada situação da nossa vida. Deus connosco porque Ele nunca nos abandona, é hóspede permanente e desafia-nos à hospitalidade. Sim, Ele vem hoje e sempre para nos reconciliar, restaurar aliança e transformar a hostilidade em hospitalidade.
Como foi o seu nascimento? Conta-nos S. Lucas: Enquanto ali se encontravam, chegou o dia de ela dar à luz e teve o seu Filho primogénito. Envolveu-O em panos e deitou-O numa manjedoura, porque não havia lugar para eles na hospedaria.
Naquela noite a hospedaria não tinha espaço para a hospitalidade. E andava Deus à procura de hospedagem onde ser recebido. Tinha sido acolhido no coração e no seio de Maria; tinha sido recebido por José mas para nascer não tinha lugar. Maria e José encontraram, no meio dos pastores, numa gruta de animais que na sua simplicidade e pobreza foi a porta do céu.
A gruta que era lugar aparentemente inóspito tornou-se símbolo da hospitalidade. Esta noite podemos contemplar a gruta, ir ao encontro do Menino e descobrirmos como no presépio reina a hospitalidade.
Ainda hoje Jesus procura hospedaria, procura uma morada em nós, não nos nossos palácios mas no mas no coração de cada família, no íntimo de cada pessoa ... e temos apenas um gruta para lhe oferecer, uma gruta feita com as nossas fragilidades e miséria... mas se abrirmos com amor e alegria, ele transforma-as em casa de misericórdia, ele transforma a nossa pobreza e faz-nos dignos para hospedar o Filho de Deus.
Ainda hoje Deus anda à procura de lugar onde nascer e onde habitar no meio da humanidade. Há portas fechadas por receio, desconfiança, indisponibilidade, desconhecimento .... e tantas que se abrem como braços abertos e aí brilha a luz. Onde há hospitalidade, é vencida a hostilidade, a luz dissipa a escuridão do desencontro.
Diz-nos o profeta Isaías na primeira leitura: O povo que andava nas trevas viu uma grande luz; para aqueles que habitavam nas sombras da morte uma luz começou a brilhar. (…) Porque um menino nasceu para nós, um filho nos foi dado.
Deus procura um lugar entre nós e também nós vivemos à procura de um lar, de uma morada onde haja hospitalidade, segurança e proteção. Somos também nós crianças frágeis como Jesus. E como a Sagrada Família, somos todos peregrinos, migrantes, em certo sentido somos todos desalojados .... no meio da insegurança, da solidão, do desamparo, dos medos .... experimentamos a hostilidade e por isso tanto desejamos a hospitalidade.
A família é o lugar privilegiado para a hospitalidade, é onde há uma casa e sobretudo onde temos um lar. É onde há acolhimento mútuo, compreensão profunda, segurança. Percorremos kms no Natal para ir ao encontro da hospitalidade dos pais, dos avós, dos familiares; procuramos estar perto para dar e receber a luz que nos faz sentir em casa.
A hospitalidade deve também brilhar nos nossos ambientes escolares e profissionais, na sociedade e na igreja. Só com ela vencemos a hostilidade da indiferença, da competitividade agressiva, e dos medos que transformam os outros em potenciais inimigos e não em irmãos ou amigos.
Partindo destes espaços da nossa vida, sonhamos transformar o mundo inteiro numa casa comum, sonhamos uma família de todos os povos, onde há espaço para todos, onde há paz, justiça e solidariedade. Nesse desejo, hoje acendemos a vela pela paz ...
Este sonho começa a ser realidade e mantêm-se vivo em cada Natal, como nos diz S. Paulo na II leitura: Manifestou-se a graça de Deus, fonte de salvação para todos os homens. Por isso, este sonho de paz, realiza-se na manifestação do Deus connosco porque Ele é um Deus de paz ... é um Deus da hospitalidade e não da hostilidade.
Este sonho constrói-se pelo caminho da hospitalidade. Só assim rompemos a fronteira da desconfiança, do preconceito, do desinteresse ou a da indiferença e da agressividade. Não deixemos que a hostilidade invada o nosso coração pois aí perdemos a guerra mais importante no íntimo de nós; não deixemos que o medo e o desconhecido nos roubem a capacidade para a hospitalidade.
A hospitalidade constrói a paz; a hospitalidade é cultura de Aliança que começa nas relações pessoais que fazem parte das nossas vidas. A hospitalidade implica criar espaço em nós para acolher, fazer silêncio para escutar, vencer a arrogância de quem sabe sempre tudo, baixar da altivez de quem não precisa de nada dos outros.
Contemplemos a gruta de Belém e adoremos o Menino. Peçamos-lhe o dom da hospitalidade para sermos morada de Deus no meio dos homens, para sermos gruta que acolhe, com humildade mas disponível, para ser abrigo na noite e na tempestade, para ser uma luz no meio do nosso mundo.
Santo Natal!
Padre José Melo